Gabriel Carvalho*
Durante os dias 28 e 29 de julho, os apaixonados por forró tiveram a oportunidade de dialogar sobre o ritmo mais querido dos nordestinos, principalmente no que se refere às suas perspectivas de futuro. O seminário Tem Forró Sim Sinhô contabilizou quase dez horas de muito conhecimento, com exposições de experiências exitosas e também reflexões de quem respira por meio de aparelhos conhecidos como triângulo, zabumba e sanfona.
Nomes tarimbados da música nordestina como Adelmario Coelho, Zelito Miranda, Armandinho do Acordeon e Santanna, o Cantador, falaram sobre suas experiências de vida e de palco e foram questionados por uma pergunta que parecia ser combinada pela plateia de 40 pessoas que compuseram aquela sala e outras 1,5 mil que assistiram as palestras nas redes sociais: Quando vai haver a união dos forrozeiros?
Essa talvez seja a chave de um enigma que, se desvendado, pode transformar de uma vez por todas o forró no ritmo preferido dos brasileiros. Ainda há barreiras como o auto-preconceito e o medo de assumir-se forrozeiro em público. Estamos aí diante de um armário que até mesmo os nordestinos têm receio de sair.
Entretanto, não é assim tão fácil mover toda essa engrenagem. Líder da banda Fulô de Mandacaru, banda que foi nos estúdios da TV Globo desbancar os queridinhos de Sandy, que nos anos 1990 fez dupla com irmão Junior, Armandinho do Acordeon tocou numa ferida que os forrozeiros não gostam muito de futucar. A falta de profissionalismo e de autoestima dos grupos que tocam xote, xaxado e baião ainda são latentes. Ora pela falta de condição financeira, pois muita gente ainda vende almoço para comprar janta, ora pela mentalidade de músico, que acha a sua arte sozinha é suficiente para conquistar o público.
Os tempos mudaram e o gerente de Marketing Regional da Ambev, Renan Carvalho, mostrou para os participantes do seminário como as cervejarias estão pensando. Os negócios estão cada vez mais se voltando para a economia colaborativa e as grandes marcas querem fazer parte do contexto, ou seja, da construção do produto e isso vai desde o figurino e repertório às ações nas redes sociais.
Músico e sócio de um projeto que engloba uma agência digital e de produção audiovisual, Fernando Cairo, falou que é essencial as bandas terem produtos eletrônicos como clipes e lives e mostrou que isso pode ser feito com baixo custo. Aliás, a imagem de um grupo musical nas redes é tão importante quanto a sua qualidade fonográfica e os seus valores culturais. Santanna foi cirúrgico em sua fala: “O forró toca o ano inteiro. Ainda toca timidamente, pois não é moda. Nos EUA, 40% do orçamento está destinado à divulgação e 60% para a execução de um trabalho musical. Aqui, se duvidar, são 110% só na execução”.
O que o relato do Cantador nos traz de lição? Precisamos mostrar mais o nosso talento. A jornalista Luciana Amâncio, que trabalha na divulgação de startups, aponta que o investimento em mídia retorna em forma de novos compromissos em agenda, aparição e novos negócios. Parece simples, mas ainda não é regra.
E onde é regra os resultados são claros. Veja o exemplo de Adelmario Coelho: além de brilhante artista, ele tem todo um aparato por trás da sua carreira, na qual me aterei apenas ao quesito divulgação. Presente nas redes sociais e com um material,composto por vídeos e fotos, esteticamente impecável, ele atualiza suas ferramentas de janeiro a janeiro. Somando-se isso ao seu talento, ele celebra o fato de ser um dos forrozeiros mais bem sucedidos do Brasil.
Os artistas e bandas que têm um escritório de representação obtêm os melhores resultados, pois ainda contam com um lobby forte empresarial, mas por que isso acontece? Fácil: os produtos são conhecidos, as suas músicas e imagens são exaustivamente compartilhadas e isso faz com que eles estejam na boca do povo.
Mas e a união dos forrozeiros, o que tem a ver com o gole de cerveja? Essa palavra quase que inatingível, em se tratando de forró, salvo em algumas exceções, é explicada pelas audiências das lives de quem faz o ritmo no Nordeste. A cervejaria trabalha com lucro, os forrozeiros têm dado audiência e, com a pandemia, as pessoas passaram a consumir música em forma de live, em vez de shows e isso faz com que as gôndolas dos supermercados tenham para si um ágil trabalho de reposição por parte dos profissionais.
E foi pensando numa maior diversidade que a Skol juntou Xand Avião com Wesley Safadão, com Raimundo Fagner, fazendo dois encontros totalmente improváveis. O segundo, então, foi motivo de comemoração pelo empresário do entretenimento Jânio Amilcar, que há mais de duas décadas contribui para o cenário forrozeiro em Salvador, mas, pressionado pelo baixo faturamento no bar, teve que se render ao Axé Music e outros ritmos. Às vezes essas misturas de vertentes forrozeiras são vistas de olhos tortos, mas segundo a pesquisadora e jornalista Preta Barros, as distâncias estão diminuindo.
Aliás, o baiano Zelito Miranda já vem promovendo essa união de forrozeiros há mais de dez anos no seu Forró no Parque, que lota uma das praças do Pelourinho, principal cartão -postal de Salvador. No entanto, a iniciativa ainda não foi compreendida pelas casas de show da da capital baiana. A fórmula do Cabeludo é de sucesso absoluto de público, pois ele não faz distinção de quem é raiz e quem é estilizado. Ah, mas é de graça.. pode exclamar o pessimista. Até pode ser um motivo para a lotação, mas não é o principal, pois o evento conta com elementos que colocamos aqui neste próprio texto como essenciais como a divulgação e uma estética harmonizada, como a que é bem organizada pela empresária Telma Miranda.
E para encerrar esse papo de união, vejamos o sucesso nas redes e fora dela dos cearenses ex-Mastruz. Bete Nascimento, Aduílio Mendes, Kátia Cilene e França despertaram algo no público que não conseguiram fazer em suas carreiras solo: uma grande expectativa. E para melhorar o cenário, os fãs foram correspondidos. Numa live cercada de animação, qualidade musical, repertório bem escolhido e intensa divulgação prévia, eles obtiveram uma grande repercussão e despertaram o desejo de um show no futuro pós-pandemia.
*Gabriel Carvalho é jornalista, publicitário é apaixonado por forró